Caros
leitores, cheguei a duas conclusões que preciso democratizar com vocês. A
primeira delas é que o nosso destino não é linear, é paradoxal. Comprovei isto
alguns dias atrás em que descobri um presente embrulhado em uma injustiça.
Havia me instalado em uma pensão de uma senhora de idade avançada, onde
aparentemente, a “sanidade” reinava. Não era meu objetivo morar em um hospício
construído às custas dos valores capitalistas. Mas, todos somos escravos de
forças que ninguém sabe a procedência, contudo crê, instantaneamente porque
buscamos preencher o vazio que o mistério sobre nossa verdadeira gênese neste
mundo promulgou. Quando alguém morre, por exemplo, a gente insiste em acreditar
que o motivo de todo aquele sofrimento é que afinal, já tinha chegado a hora
dela; ou quando uma pessoa extremamente de mal com a vida, sofre um
acidente e fica tetraplégico, e de uma hora para outra, começa a visualizar o
verdadeiro valor da vida: tava escrito ele tinha que passar por isso para
aprender a viver melhor.
Assim, lá
fui eu de mala e “livros”, coabitar com a idosa e mal sabia que iria viver uma
situação premeditada- sim, porque também acredito que nada acontece por
acaso...- que serviria depois de tema para um trabalho na faculdade. Nos
primeiros dias de convivência, adotei aquela senhora como uma avó que nunca
pude paparicar, por sempre me encontrei longe das minhas progenitoras de
primeira geração. Ela era meio esquecida das coisas e as demais pensionistas me
alertavam para o seu jeito um tanto mal educado e extremamente econômico.
No entanto, não via-a desta forma e respeitava suas conversas repetidas e as
vezes um tanto inverossímeis. Imaginava a vida peculiar desta senhora que
literalmente ficou para titia. Nunca casou nem teve filhos, sobrevivendo
independentemente e construindo sua herança com trabalho árduo e dedicação. Mas
uma coisa eu pude perceber desde a primeira troca de olhar entre nós: sua obsessiva
desconfiança. Vejam que cômico: todo o seu dinheiro ela guardava em uma
bolsinha que pendurava em seu pescoço como se fosse um colar (cá entre nós, a
sua jóia). Alertava-me que uma vizinha-sua irmã-entrava dentro de casa e
roubava suas coisas.
Para seu esquecimento diário construía álibes: ladrãos. A
princípio eu até acreditava, mas depois observei que não passava de delírios.
Delírios de uma mulher que a vida toda foi vítima de exploração, convivendo com
pessoas mal-intencionadas que se aproveitavam de sua solidão para lhe extrair
seus ganhos, entre eles sobrinhos que a visitam até hoje para diagnosticar seu
estado de saúde e sonhar com a possível tomada de seus bens. Dizia com a boca “E
aí vovó tudo em cima?”; mas dentro de seu cérebro sujo inqueria “Quantos
anos a senhora ainda vai durar, preciso começar a fazer meus planos”. No
atual sistema social todos os valores são etiquetados, as relações entre as
pessoas assemelham-se a um empreendimento empresarial-objetivas e
interesseiras.
Assim, passei a aceitar que a doença daquela senhora seria a
doença do século, e todos nós na velhice teríamos os mesmos sintomas que ela.
Desculpem-me: cometi um engano. Não será preciso esperar tanto tempo para isso
acontecer. Comparem: certa vez a idosa perdeu o seu dinheiro e não havia santo
que encontrasse. Ela passava a então insinuar “tem ladrão nesta casa”. Mas,
adivinhem só onde estava a grana: dentro de suas “ceroulas”. Hora, deputados e empresários, que por sinal estão longe de se aposentarem já fazem isso há
muito tempo não é mesmo?...Mas tinha chegado a minha hora de sentir na pele
sua patologia capitalista. Certo dia ao chegar em casa depois da aula fui
surpreendida. Repentinamente ela me colocava porta afora, acusando-me de roubar
uma calça e um casaco seu (só se era para por em um museu, pensei eu,
rancorosa). Além disso, a senhora achava que havia sumido R$70.000,00! Hora, fiquei atônita; perdi o chão. Reivindiquei por
justificativas; afirmei minha inocência, mas ela estava já de cabeça feita. Saí
de lá extremamente preocupada. Estava sem teto, é verdade; mas, sobretudo porque
cheguei a uma surreal segunda (lembram?) conclusão: na verdade, não são os loucos
que vão para o hospício; é o hospício que produz os loucos. E este
hospício se chama sociedade moderna.
De uma maneira nada convencional, o filme Clube da Luta, ilustra essa sociedade capitalizada, alimentada pelo niilismo, pela crise de identidades, ausência de valores, mas que ao mesmo tempo integra uma variedade de possibilidades. O título nos remete à violência, mas ao contrário, Clube
da Luta é um filme sobre ideologia, com uma crítica bem ácida sobre a
sociedade moderna. Confira o trailer abaixo:
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